Doações de órgãos devem ser estimuladas
03 September 2007
No mês em que se celebra o Dia Nacional da Doação de Órgãos, a Bahia não tem muito a comemorar: o Estado é o antepenúltimo colocado de todo o País em quantidade de transplantes. O serviço de captação de órgãos dos hospitais públicos é deficiente e faltam pessoas dispostas a doar. O Hospital Português faz a sua parte para mudar esse quadro. A Instituição é pioneira em transplante de medula óssea, córneas, rins, fígado e coração. Atualmente os quatro primeiros tipos são os únicos realizados na Bahia.
O Dia Nacional da Doação de Órgãos, 27 de setembro, chama a atenção para um problema grave: o crescimento contínuo das filas de espera. Estima-se que mais da metade dos pacientes que necessitam de fígado, no Estado, morrerão. As salas de hemodiálise estão cheias de pacientes com Doença Renal Crônica Terminal, e aqueles que precisam de córnea utilizam remédios paliativos, enquanto esperam por uma doação.
Em julho, o número de transplantes teve um aumento significativo, de mais de 100%, em todas as especialidades, em comparação com meses anteriores. Os médicos comemoram as novas marcas, mas vêem esses dados com cautela. A demanda reprimida – que já se acumulou na fila – não foi suprida, e os números, mesmo com o aumento, continuam muito aquém do ideal. Para não haver falta de órgãos, 20% da população precisaria ser doadora e, na prática, não chega a 1%.
Estima-se que seria necessária a realização de 60 transplantes por milhão de pessoas a cada ano. O Brasil está longe de atingir esta marca e a contribuição da Bahia não tem sido muito expressiva. Os profissionais temem que esse avanço seja um surto passageiro, provocado pela divulgação, na mídia, da morte do diácono Sérgio Fontes e da iniciativa de sua família em doar os órgãos do clérigo. “Alguns eventos, quando divulgados, elevam as taxas de doação. Já tivemos casos semelhantes, com novelas ou campanhas”, conta Dr. Marco Aurélio, oftalmologista responsável pelos transplantes de córneas no Hospital Português. Segundo ele, o número de doadores aumentou num período, mas voltou a estabilizar-se após algum tempo.
A fim de sedimentar a importância da doação, são defendidas ações de longo prazo, como orientação escolar – desde o fundamental até ao ensino superior – sobre a importância da prática e maior qualidade no atendimento público de saúde. “As maiores taxas de doação se encontram nos lugares onde a população está mais bem educada”, revela Dr. Ivo Coelho, coordenador do transplante renal no Hospital Português. Para ambos, o bom serviço público de saúde faria com que as pessoas se sentissem mais amparadas pelo Estado, portanto, mais propensas a pensar na comunidade.
Educação médica
Outra causa do baixo índice de doações se encontra na própria comunidade médica. Os profissionais não aprendem sobre transplantes, na faculdade. Uma parte, normalmente os que desejam trabalhar com essas cirurgias, faz cursos de especialização; a outra parte não chega a conhecer a fundo as técnicas e a importância do transplante, negligenciando o impacto sócio-econômico que tais programas exercem na comunidade.
Um único doador pode evitar várias mortes, doando coração, rim, fígado, pulmão, pâncreas, além de melhorar a qualidade de vida de quem precisa de córnea, esclera (parte branca do olho), pele, ossos ou outras estruturas. Para que a maior parte dos órgãos seja aproveitada, o indivíduo precisa estar em morte encefálica. O médico e a Central de Órgãos precisam executar um protocolo para diagnosticar morte encefálica através de exames clínicos e neurológicos. O protocolo exige a otimização das condições do paciente, a fim de verificar doenças que possam ser prejudiciais à doação como infecções, doenças degenerativas graves ou alguns tipos de câncer.
É importante ressaltar que, para a doação de olhos, pele e osso, não é necessário, unicamente, ficar à mercê da morte encefálica, pois é possível utilizar as doações provenientes de mortes naturais, traumáticas e por doenças crônicas e agudas. Também é fundamental informar que algumas doações podem ser feitas entre vivos, como acontece nos casos de transplantes de órgãos como rins, fígado, pele, conjuntiva e, principalmente, tecidos como a medula óssea.
Apenas um, de cada nove eventos de mortes encefálicas, é adequadamente comunicado às centrais de doação de órgãos. Recentemente, o governo federal obrigou todos os hospitais com mais de 80 leitos a criarem as comissões intra-hospitalares de transplantes. A Instituição indica o nome de pessoas de sua área médica e paramédica para estimular, provocar e conseguir doações. As comissões trabalham orientando e realizando abordagens de futuros e/ou prováveis doadores. “Ao formar uma equipe de transplante, o Hospital dá um salto na qualidade técnica do atendimento ao paciente”- pondera a Dra. Andréa Cavalcanti, hepatologista do Hospital Português.
Para conscientizar a comunidade médica, está em andamento um projeto de
inserção da matéria “transplante” nas faculdades de medicina. Dessa forma, os estudantes terão, desde cedo, conhecimento sobre a importância do processo e serão profissionais melhor qualificados para estimular o hábito da doação.