Salvador, 01 de Janeiro de 1857…
22 February 2013
Na época, a concepção de medicina urbana não era de uma medicina centrada nos homens, corpos e organismos, mas no meio que o cercava; o ar, a água, a estrutura das ruas, ou seja, uma medicina que priorizava as condições de vida, sem necessariamente observar as conseqüências das reestruturações urbanísticas na vida dos homens.
A Salvador do século XIX não impunha separação rígida entre pobres e ricos no que diz respeito aos locais das suas habitações. Os baianos viviam em habitações inadequadas, convivendo com a sujeira e com a pobreza. A população estava exposta, cotidianamente, aos riscos da fome e de doenças, sendo um alvo fácil para epidemias e endemias.
A distinção dos grupos sociais existentes em Salvador era identificada através da tipologia das casas e pelas condições de moradia. As habitações dos pobres e dos escravos eram pouco arejadas, carentes de luz, com excessiva umidade e calor. Essas edificações eram contrastadas por casarões de pessoas de posses, com muitas janelas e áreas de ventilação possibilitando iluminação natural. Era inexistente nas habitações, independente da classe social, um sistema de esgotamento sanitário.
Na cidade, o sistema de esgoto era desorganizado, resumindo-se a precárias galerias isoladas. Além da falta de higiene, naquela época, a capital baiana também foi ameaçada pela escassez de alimentos, causada pela seca que possibilitou o aparecimento e disseminação de epidemias. As moléstias que estiveram presentes nesta rotatividade epidemiológica foram: varíola; tuberculose; impaludismo; beribéri; peste bubônica; febre tifóide; disenterias e lepra. Daí a importância da criação de um hospital para o atendimento aos portugueses que vinham tentar a vida na Bahia e que acabavam ficando doentes pelas próprias condições impostas pela época.
Para se ter uma idéia do quanto essas doenças foram importantes para a história não só dos portugueses, mas dos baianos e brasileiros, a Cólera Morbus, foi uma das epidemias de maior impacto. Estima-se que na Província baiana a doença resultou em 40 mil óbitos. Em Salvador, com base nos dados oficiais, o número chegou a quase 4 mil pessoas.
Visando sanar o problema, o presidente da Província da época, Dr. Álvaro Tibério de Morcovo e Lima, recorreu ao corpo médico com a esperança de reduzir a ação do Morbus e anunciou diversas providências que deveriam ser tomadas, providências estas que tornaram-se normas e passaram a constar na legislação sanitária do estado republicano baiano.
Algumas dessas medidas: instruções sanitárias para a população; visitas domiciliares para verificar as condições higiênicas do recinto; abertura de postos sanitários e hospitais; fornecimento a todas as boticas dos medicamentos receitados para combater a doença, com distribuição gratuita; convocação de todo o corpo médico disponível na Província e regiões vizinhas; impedimento de enterros dentro das cidades, vilas e povoações; criação de cemitérios e desinfecção das casas, templos e cemitérios existentes, para evitar proliferação.
Nesse contexto histórico foi concebido o embrião do que hoje é a Real Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro. Uma instituição que se negou a ficar presa ao tempo e assim foi se modificando junto com o ambiente no qual está inserida e se adequando às novas necessidades que foram surgindo. Se Salvador mudou, o Hospital mudou junto. Num processo constante de evolução, ele foi se adaptando às transformações pelas quais a cidade passou até chegar finalmente aos dias de hoje.
Fonte: Histórico da Real Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro