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Tempo de realizar — Hospital Português da Bahia

6 de dezembro de 2013

Tempo de realizar

06 December 2013

“Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente”. Os versos finais do poema Cortar o Tempo, escrito por Carlos Drummond de Andrade, manifestam a marca simbólica do ano novo: o encerramento de um ciclo que dá início a uma nova etapa. Nesse momento costuma acontecer a clássica retrospectiva de vida, quando projetos e realizações são confrontados na esperança de que o saldo seja positivo. Parar de fumar, começar uma dieta ou atividade física, equilibrar as finanças, dedicar mais tempo à família, aos amigos, ao lazer. Promessas vulneráveis, passíveis de serem adiadas, a despeito do desejo legítimo de alcançá-las. No ensejo do fim de ano, rituais de passagem e simpatias típicas ajudam a reforçar as expectativas de um futuro promissor e o imaginário de que nos meses seguintes tudo vai mudar. Para a psicóloga Fernanda Neder, líder do Serviço de Psicologia do Hospital Português, é importante lembrar que o novo ano não vai determinar que cada um se modifique, mas pode representar a chance de desenvolver o autoconhecimento. “Sempre é tempo de mudar e não é preciso um novo ano, necessariamente, para tomar essa atitude”, observa. 

 

Ressignificar a vida é uma decisão trabalhosa, que demanda tempo e várias doses de perseverança, mas foi o que fez o professor universitário, Antônio Lima, 30 anos, quando decidiu deixar sua terra natal 12 anos atrás, apenas com “a cara e a coragem”, em busca da realização de sonhos e projetos pessoais. “Sempre vi na educação um instrumento importante de melhora de condição de vida. Enfrentei dificuldades em Salvador, mas sempre conciliei estudo e trabalho”, revela. O esforço foi recompensado em 2003, com o ingresso na Universidade Federal da Bahia – UFBA, no curso de Pedagogia. Quatro anos mais tarde, já com o diploma de graduação, o jovem de Barra, município situado a 680 km da capital baiana, de origem social simples, ingressava no mestrado. Hoje, aluno regular do doutorado em educação na mesma instituição de ensino, ele concilia os estudos com a consultoria pedagógica e a docência, enquanto anseia pela defesa de tese prevista para acontecer em 2016. Planejar os objetivos de vida é um hábito, que o professor diz adaptar às situações sempre que necessário para evitar estresse, desapontamento e frustração. “Na maioria das vezes, obtenho sucesso. Mesmo havendo obstáculos, reconheço a necessidade de persistir na busca dos sonhos, afinal nossas realizações não caem do céu ou acontecem do dia para a noite. Dependem, sem dúvida, das nossas iniciativas e escolhas”, assegura.

 

De acordo com a psicóloga Fernanda Neder, todo indivíduo é regido por dois tempos: o cronológico, do consciente, que caracteriza o tempo da ação e execução; e o tempo do inconsciente, que é atemporal e subjetivo. Seguindo essa lógica, cada sujeito produz, constrói e alinha a própria história e projetos de vida conforme a sua possibilidade psíquica. “Somos sujeito do desejo, regidos pelo inconsciente e nosso funcionamento psíquico não corresponde ao tempo cronológico. O tempo de cada sujeito não é linear, sequencial. Logo, nem sempre os fatos e metas se ordenam numa condição de causa e efeito”, afirma. Dessa maneira, a especialista justifica porque algumas metas passam pelo crivo do consciente e  são executadas facilmente, em curto prazo; enquanto outros planos permanecem pendentes, transcorrem indefinidamente pelo tempo cronológico e dificilmente são executados. Para essas situações, Fernanda considera necessário o reconhecimento de que as mudanças ocorrem não apenas pela crença em superstições, simpatias ou  simples virada de ano, mas pela participação determinante que cada pessoa exerce na própria mudança de vida. “É preciso perceber que a transformação vem de cada um e não do outro, do mundo externo. Mudar requer responsabilização, compromisso e investimento pessoal”, observa.  

 

Com um cotidiano atribulado, ora planejando e lecionando aulas para alunos do ensino médio, ora se dedicando à faculdade de direito, atividade que requer horas de leitura e estágio, a funcionária pública Rosana Santos procura compensar a rotina de trabalho e estudos, com momentos de lazer dos quais não abre mão. A fim de manter o equilíbrio entre desejos e conquistas pessoais, a servidora busca organizar o tempo para desfrutar as horas livres com a família e os amigos, sobretudo, praticando seu hobby favorito: viajar. “Trabalho muito para concretizar as minhas metas, por isso preciso usufruir desses momentos de diversão, que me ajudam a repor as energias e manter a qualidade de vida”, afirma. Segundo a  psicóloga Fernanda Neder, estar atento às próprias necessidades é essencial para preservar a saúde psíquica, além de uma condição elementar para manter o compromisso e investimento nas metas que viabilizam o alcance do bem-estar. “Estar aberto e escutar o que ressoa dentro de si é uma forma de se manter consciente das próprias possibilidades e limitações; e de se aproximar do que é e do que pode vir a ser”, conclui. Como bem disse o poeta Drummond, “para ganhar um ano novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre”.

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